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segunda-feira, 22 de outubro de 2007

Rima?

As crianças, os chatos e os cientistas (crianças chatas e cientistas chatos são regra... sorte que crianças não costumam ser cientistas!) adoram perguntar o que passa batido... pergunto: O que é a rima? Ela é costume ou necessidade?

Fragmento de O Verde Naquele Tempo, postado neste blog:

A Joaquina ainda está bonita
A Conceição parece que envelheceu
Os Ingleses foram invadidos
O que diziam ser progresso n'era não


São versos brancos (não há rimas), mas conferindo com o áudio não se sente a falta de algo. (Certo?)

Indo para o outro extremo, segue fragmento do Divisão de Bens,

Afanaste-me um duplo do Toquinho que eu vi
Tudo bem, eu tenho outros discos dele mais legais
Mas se o caso fosse o Nelson Cavaquinho, ai de ti
Ias descobrir o que o ódio faz!


"vi" com "ti" = rima rica. "ais" com "faz" = rima preciosa. Ê, mano Lolli, o homem-rigor!

Produzimos algumas rimas mequetrefes também, mas não preciso citar aqui hehe... quem quiser levar um tapa na cara, dá uma lidinha no blog "Filho de Vó", na postagem http://filhodevo.blogspot.com/2007/09/rima-prostituta-da-lngua.html. Muito bem escrito e esclarece algumas coisas!

Indo mais a fundo, Schöenberg teve uma boa sacada, algo do tipo "mais que a beleza, é importante na música a sua capacidade de ser entendida". Dá muito pano pra manga, hein? Não vou escarafunchar, basta dizer que a rima é um modo de a música fazer uma auto-referência, aumentando a sensação de entendimento por parte do ouvinte (eu diria, criando uma familiaridade com ele). Estrapolando, por que não pensar que todos os elementos musicais podem ser utilizados (tanto isoladamente quanto em conjunto) para criar essa familiaridade? Basta pensar no que se utiliza uma obra, conjunto ou movimento pra se fazer entender e apreciar por um público específico... e aí, a pergunta: deve a rima estar em um patamar privilegiado ou de obrigatoriedade frente ao vasto arsenal disponível pra cativar o apreciador? Eu não ponho minha mão no fogo... mas, por outro lado, se é pra rimar, que se faça direitinho (como pede o Filho de Vó).

Claro que arte não trata só disso. Apesar de essa observação já ser muito ampl e talvez mesmo resumir a criação artística na prática, a arte é livre. Agora... vai dizer que esse Schöenberg não teve altas idéia?

Fechando, extraído da Wikipedia: "... [a rima] não era conhecida pela poesia clássica latina. Este recurso poético, originário da língua árabe, só foi incorporado à poesia latina na Idade Média..."

10 comentários:

Lucas Lolli disse...

Mestre, Mestre...
Esse jeito de cutucar como quem não quer nada... a mim não enganas mais!
Pensa que eu não capto tuas intenções revolucionárias e abolicionistas quanto a todos os padrões impostos pela civilização judaico-cristã-ocidental (seja em relação à harmonia, à forma, à rima ou ao violão de sete cordas)?
Hehehe!

Bem, refleti bastante a respeito e cheguei a algumas conclusões que gostaria de compartilhar.

Meu roteiro todo trata de definir as características que uma obra deve apresentar para ser considerada arte e, a partir disso, mostrar que a rima é um dos meios de um desses requisitos ser cumprido para o caso da poesia.

Pretensão? Muita. Definir o que é e o que não é arte (ou estabelecer critérios para isso) me parece, sem dúvida, uma discussão que ultrapassa a possibilidade do consenso objetivo. Estamos tratando daquilo que de mais subjetivo pode existir. Na prática, arte é simplesmente "aquilo que é considerado como tal", ou seja, não há critérios expressamente definidos, mas um "sentimento" geral (ou particular) com relação ao que é e o que não é arte.

Todavia, se buscamos algum tipo de conclusão ou compressão mais profunda acerca do que fazemos (que é como me soa o objetivo da provocação feita por este tópico), uma análise objetiva necessita ser feita, e, para isso, algum axioma deve ser assumido.

Portanto, peço perdão pelo rigor científico do meu texto daqui para diante. Espero que ao menos seja justificável pelos resultados obtidos.

Segue no próximo comentário.

Lucas Lolli disse...

Os axiomas de que necessitamos devem, naturalmente, ser obtidos a partir da observação da realidade empírica.

O primeiro axioma que assumo coincide com a idéia de Schönberg citada no tópico, qual seja: a inteligibilidade, e não a beleza, é a característica fundamental da arte.
Considero este postulado razoável pois a beleza, como percebemos, não é uma característica que pode ser adequadamente associada a uma série de obras que, não obstante, são consideradas artísticas. De fato, o que percebemos em comum entre tudo aquilo que consideramos arte é o fato de expressarem algo, e algo que possamos compreender (tomando aqui um conceito amplo de "compreensão", naturalmente).

Nota-se, porém, que a inteligibilidade apenas não basta para definir o que é arte. Uma manchete de jornal é inteligível e, não obstante, não é arte.
Nesse ponto, tomando novamente como referência a observação empírica, fica relativamente claro qual deve ser, a segunda característica fundamental da arte: a subjetividade.
Ou seja, uma obra artística, para poder ser assim considerada, deve apresentar algum apelo que transcenda a mera assimilação racional de informação - algo que mexa com o que há de essencialmente humano em nós.

Assim, a partir da observação empírica, encontramos, duas características fundamentais de uma obra de arte: inteligibilidade e subjetividade.
Expresso este resultado novamente na forma concisa seguinte.

Uma obra artística caracteriza-se por:

1 - transportar uma mensagem inteligível;
2 - possuir apelo subjetivo.


Continua no comentário seguinte.

Lucas Lolli disse...

Tendo encontrado estes dois critérios (os quais, reitero, são apenas uma ferramenta que nos possibilitem uma análise minimamente apropriada, e não verdades absolutas, visto que não tratamos aqui de um objeto de estudo que possamos considerar como exato), vamos agora aplicar este modelo para as letras.

Temos, nesse caso, que a parte da inteligibilidade está no conteúdo dos versos, o significado daquilo que está sendo dito (incluso aí também o estilo de escrita e todas as possíveis referências que levem o interlocutor à identificação com o que está sendo dito). O apelo subjetivo, por sua vez, está na forma, no recipiente plástico que encerra aquele conteúdo - rima, métrica, figuras de sonoridade etc.

Existe, todavia, um fato peculiar com relação às palavras. Estas, ao contrário dos sons, gestos, cores e formas visuais, são símbolos per si, ou seja, não são entidades independentes ou existentes no mundo material que podem vir a assumir um significado num dado contexto, mas, ao contrário, são, desde sua origem, representações de uma idéia. Desse modo, a arte da escrita adquire a particularidade de trabalhar com objetos que possuem significado inteligível já por princípio - o primeiro "requisito para ser arte" já vem cumprido "de fábrica".
Assim, o que faz crucialmente de uma letra poesia é a presença do segundo elemento (o apelo subjetivo), que pode se manifestar através da rima, mas também através de outros recursos como já citei.

É assim, portanto, que enxergo a rima (bem como os demais elementos formais da escrita poética): um meio de prover a letra de um apelo subjetivo/plástico/estético, o qual, somado à inteligibilidade da mensagem que está sendo transmitida, compõe a totalidade das características necessárias para que a letra seja considerada uma obra de arte.

Finaliza no próximo comentário.

Lucas Lolli disse...

Sem dúvida, há uma série de parênteses e mesmo contraposições que podem ser feitos com relação a esta elaboração. Eu mesmo, no decorrer da escrita deste texto, detectei exemplos que contrariam a forma estrita de alguns argumentos que utilizei (como os poemas dadaístas). Pretendo tratar desses casos mais adiante, aos poucos, e a partir também das opiniões dos demais, de modo a poder construir uma elaboração mais sólida e sofisticada a respeito deste tema.

Ainda assim, esta pretensiosa "teoria da arte" elaborada em cerca de duas horas de reflexão está aqui apresentada numa forma que acredito conter já os elementos cruciais do que poderá vir a se tornar após uma elaboração maior, de modo que já considero justo publicá-la.

Não tratei, também, como se vê, de casos particulares, nem cheguei a colocar uma perspectiva mais interna com relação à "fisiologia" da rima nas letras de música - como fizeram Mestre Tiaguera e Filho de Vó. Optei por lançar os alicerces de uma construção mais geral e fundamental para posteriormente tratar das questões mais práticas.

Haverá tempo. E, espero, mais contribuições. Encerro aqui por ora, que a apresentação dos Bandolindos é daqui a pouco e eu preciso sair.
Vamos tocar, fazer arte, que, no fundo, é o que a gente quer.
O blá-blá-blá fica pras horas de folga.

Abraços e até breve!

Anônimo disse...

Olá, Tiago!

Desculpe, mas só fui ver agora seus comentários. Valeu por me citar e parabéns pelo post!

Abraço.

Tiago disse...

Meu santo! Nunca vi tanta bobagem junta! Quanta pedância! haha tô brincando...

Então, o segócio é o neguinte:

Resumindo absurdamente o que colocas, Lucas, lembras que a rima é um recurso. Portanto, descartável (logo, respondes a pergunta do post -> a rima é costume, não necessidade). Mas por outro lado, lembras que ela agrega valor - "...um meio de prover a letra de um apelo subjetivo/plástico/estético". E mais, colocas que esse apelo trabalha no sentido de possibilitar que uma letra se torne uma obra de arte (no sentido usual da coisa. Entendi certo?)

Beleza, concordo... aliás, até acho que tuas letras costumam ser melhores que as minhas hehe. Mas quando eu cito o tal do Schöenberg, eu estou questionando o valor da rima. No nosso costume, ela é prat'camente indispensável. Eu pergunto se uma boa interação entre letra e música não poderia tirar a rima desse trono (não abolir, mas tirar esse valor de dogma).

Por exemplo, o fragmento d'O Verde Naquele Tempo que eu coloquei ali... me parece muito bem entrosado com a melodia, dispensando a rima sem problemas... (na verdade, infelizmente eu não sei dizer se, apesar da falta de rimas, algo nas palavras não colabora pra isso também).

Percebo, por exemplo, que "A Joaquina ainda está bonita", em termos de letra e música (e considero aqui inclusive a dinâmica - está mais baixa que o "vamos lá" e todo o trecho que vem antes) está sereno e lírico. "A Conceição parece que envelheceu" não tem uma métrica ideal, mas fora isso, me parece bem conduzido... "Os Ingleses foram invadidos" fechou legal (o "invadidos" ressalta a angústia na afirmação). A última frase também, sem problemas. Tudo sem rima... é pra isso que eu quero chamar a atenção... a música com entrosamento o suficiente para tornar a rima um opcional.

Alguém vai dizer: ah, mas se rimasse, melhor ainda! Bom, eu não me convenço de que a rima sempre é uma vantagem estética... seria???

Por fim, há algo a ganhar quando não se pensa em rima? Eu acho que poderiam haver 2 vantagens:
1) dá pra escolher as palavras exatamente
2) acostuma a pensar na música como um todo

Bom, rimar não exclui o item 2). Mas exclui o 1). Que por sua vez pode não ser um grande problema...

Gostei do desenvolvimento teórico. Como diz a gíria, boto fé!

Lucas Lolli disse...

Saquei onde queres chegar.
O meu texto foi no sentido de tentar desvendar de onde a rima vem, o que eu considero um passo importante pra se chegar no objetivo do tópico: encontrar pra onde ela vai - não é isso?

Antes de prosseguir, gostaria de acrescentar ao que eu mesmo disse. O valor que a rima agrega não é só plástico, como eu havia mencionado, mas também de compreensão. Ou seja, a rima em si, da mesma forma que a métrica, constitui um sistema. Existem regras e tipos, de modo que o valor que ela expressa também está ligado a uma certa forma de compreensão sistêmica da letra - para além da mera apreensão do conteúdo do que está escrito (o que vai ao encontro do que já tinhas falando, de modo mais breve, no post inicial). Dessa forma, a rima acaba contribuindo para os dois aspectos da obra artística: o estético e o inteligível (que, na prática, acabam até se confundindo um pouco).

No fundo, essas normas formais pré-estabelecidas, ao contrário de limitantes, são, na minha opinião, facilitadores da criação (o mesmo vale para as normas de forma e harmonia da música). Se eu penso "vou escrever uma letra livre" não sai nada. Agora, se eu decido, "vou fazer um soneto em redondilho ABBA falando sobre o meu All-Star velho", pronto! Sai em minutos. Perguntem pra Kellen quantos scraps em forma de soneto falando de coisas banais ela já recebeu de mim.

Quanto à liberdade de escolher as palavras, sinceramente, nunca encontrei nada que fosse tão difícil de dizer numa letra que eu não o pudesse fazer rimando. Às vezes é preciso quebrar a cabeça, mas sempre vale a pena.

Reitero minha colocação inicial de que os recursos plásticos (não apenas a rima e a métrica, mas também todas as figuras de linguagem e o simples estilo poético de escrita) dão cor e vida (viu só?) ao que antes seria uma simples idéia, transformando informação em arte. Vou usar aqui um exemplo ressaltado pelo próprio Tiaguera em uma de nossas conversas.

Antes:
"Sou compromissado mas estou sendo seduzido"

Depois:
"Eu ando sofrendo tanto
Quando esta paixão me invade
Que às vezes me pego em pranto
Com receio de ferir outra amizade

Você me procura
E eu não sei negar amor nem resistir
Mas fiz uma jura
E essa jura é tão difícil de cumprir

Eu tenho pensado nisso
Mas não sei na realidade
Se desfaço o compromisso
Ou se evito um grande amor contra a vontade

Isso é uma tortura
E eu sei bem ninguém por mim vai decidir
E a paixão e a jura
Vão fazendo o coração se dividir

Talvez tudo isso seja breve
Talvez eu volte ao meu caminho
Talvez essa paixão me leve
Talvez eu venha a terminar sozinho"

Capisce?

Pois bem. Agora tu, Tiago, tens o hábito da composição livre. Pra mim, é uma coisa difícil de entender. Tanto na música quanto na letra, tuas obras escapam das formas. Eu confesso que não tenho essa capacidade. Mais: não me permito, por princípio estético. Uma peça como o Verde, por mais que me agrade, não sairia da minha cabeça não só porque não é meu hábito ou meu estilo, mas porque é "amorfa" demais pro meu gosto. Ou seja, eu gosto dela, mas, se fosse eu, faria diferente.

Nos teus escritos, dás a impressão de estar construindo uma defesa pessoal. Ainda que não tenhas recebido nenhuma crítica externa quanto aos versos brancos (que eu saiba), parece-me que tu mesmo te questionas e tentas defender o teu estilo como algo inovador e revolucionário. Agora, não sei se já reparaste, mas letra sem rima e sem métrica é o que mais tem na praça, e há muito tempo.

Na minha cabeça, o invólucro formal desempenha um papel central tanto na inteligibilidade quanto na apreciabilidade estética da obra. Eu realmente presto atenção na forma, na métrica, na rima, no ritmo harmônico etc quando ouço uma peça, e isso tudo pra mim é muito importante. Por isso acho que a obra perde muito sem esses elementos, e por isso faço uso deles quando crio. Mas essa é a minha estética, e não me impede de apreciar o que feito seguindo estéticas diferentes, nem de incorporar elementos de outras estéticas, até mesmo inconscientemente, vez que nenhum de nós é uma máquina com programação pré-definida.

Enfim, ninguém vai te apedrejar pelo teu jeito de compor. Aspectos formais não costumam te passar pela cabeça, esse é o teu estilo. Contanto que o resultado final agrade, tá valendo. Eu gosto de rimar e não vou parar porque achar que seja um recurso "antiquado" ou "limitado" - assim como não paro de tocar violão por ser um instrumento "manjado". As cabeças funcionam de jeitos diferentes e assim a arte segue.

Tiago disse...

"Nos teus escritos, dás a impressão de estar construindo uma defesa pessoal."

Sim, sim, tem um pouco disso também, além da curiosidade sobre o tema! Já ouvi me dizerem "Caramba, bicho. Arruma isso aí, não tem rima nenhuma" e, na hora, me senti uma anta hehe. Mas, por continuar escrevendo desse jeito por hábito, desenvolvi esses questionamentos sobre o tema, depois de vistos alguns resultados...

É, rimar não é revolucionário, mas acho incomum a ponto de fazer valer o lembrete da sua possibilidade!

Enfim, é muito menos uma questão de ego, é mais medo de seguir um caminho sem ver outros! Quando eu digo "Bom, eu não me convenço de que a rima sempre é uma vantagem estética... seria???" não estou sendo cínico, mas realmente perguntando! Aliás, acabo de pensar que a resposta poderia muito bem ser um "não", só que para ambas as opções - a escolha entre rimar e não rimar não determina uma tendência na qualidade da obra. Mas pra ser rigoroso, e como não gosto de demagogia, gostaria de seguir perguntando. Seria muito interessante chegar numa conclusão contra ou a favor da rima!

Mas discutir contigo não tem graça, a gente concorda em quase tudo, mesmo tendo opções estéticas diferentes! Eu queria saber as opiniões dos outros seres hehehe. E ainda por cima, a gente escreve demais! =p

Na verdade, tem algo mais que o hábito na minha tendência a utilizar pouco dos formalismos de criação de música e poesia, mas isso eu deixo pra depois...

Ah, e captei os comentários em relação ao norte que se consegue ao aplicar um pouco de técnica na hora de escrever. É isso mesmo, é a realidade... aconteceu comigo qdo comecei a compor choro, apesar de eu ter enormes dificuldades de manter o rigor na forma. Fecha parênteses.

Resumindo, eu concordo contigo acerca da razão de ser desses formalismos e sei que sabes que não são regras.

MAS, A MINHA INSISTÊNCIA MESMO, é em questionar o que é essencial e o que ignoramos acerca do que pode ser feito dento da arte pra atingir o subjetivo do apreciador...

Issaê...!

Anônimo disse...

eu concordo com os dois.. é possível?

Deve ser frustrante escrever tanto sobre um assunto tão inetressante (rimar em texto empobrece, certo lucas? entao poe outra coisa no lugar de "interessante" :P) e ninguém se manifestar..

Pois é, escrevo em defesa dos omissos. Nós (os omissos) somos como aquele cara que toca violao na roda de amigos. Ele até se expõe um pouco, mas nao vai se arriscar a subir num palco pra fazer show.

Assistimos ao show. Mas dar pitaco, aí vcs querem demais. Entendemos um pouco de arte, temos um arzoável raciocínio analítico, muito pouco de teoria musical...

Poderíamos até arriscar um raciocínio em cima do que foi exposto... mas, ter uma discussão tão rica e compromissada como ponto de partida, é meio desencorajante (vamos discutir sobre neologismo? hehe)

Faaaaaaaaaalo

Lucas Lolli disse...

Me veio uma idéia.
Vou escrever aqui pra não se perder.

O valor da rima não é binário.
Digo, para o ouvinte, o que conta não é simplesmente a presença ou não da rima. A qualidade da rima também pode ser avaliada (como o faz o Tiago por meio de adjetivos para uma estrofe do Divisão no postagem original).
Todos sabem bem que rimar "paixão" com "coração" não tem o mesmo valor (não causa a mesma impressão para o ouvinte) que rimar "estrelas" com "comê-las".

Acontece que isto é algo, de certo modo, engraçado, pois a rima, em princípio, basei-a tão somente na questão sonora. Ou seja, o valor que a rima confere à letra encontra-se no apelo subjetivo (de acordo com meus comentários anteriores) devido à repetição de sons nos fins de verso. Mas isto, como vemos, é apenas em princípio, conforme nos demonstra o acima exposto.

Este fato sugere que a impressão do ouvinte (e sua avaliação) acerca de uma obra está ligada não apenas à sensação subjetiva causada por esta somada a seu conteúdo intelectivo. Além destes dois fatores, um terceiro revela seu peso neste caso: a dificuldade (para usar o termo mais simples e direto) de se produzir aquilo. Ou seja, as rimas "beijar/amar" e "beijar/azar" possuem valores distintos devido ao fato de que há uma infinidade de verbos no primeira conjugação (infinitivo terminando em "ar"), mas muito poucos substantivos com esta mesma terminação - é mais difícil produzir o segundo tipo de rima do que o primeiro. O ouvinte atento percebe isto, e confere sua avaliação de acordo.

Note-se que a existência deste terceito critério para a avaliação da obra artística nada tem a ver (diretamente) com os critérios para a caracterização de uma obra como artística (tomados como apenas dois nos meus comentários anteriores).

Esta idéia pode ser estedida para outros elementos da letra além da rima e também para outras formas de arte.
Uma harmonia do Jobim possui um valor per se "superior" (todo o cuidado é pouco nessas horas) do que uma do Candeia - o que não significa em absoluto que a música do Jobim seja melhor do Candeia e nem mesmo que o Candeia deveria ou poderia fazer harmonias mais complexas (pois há que se levar em conta os gêneros em que cada compositor está inserido - limites são ditados pela esitlística, e, se o Candeia enchesse os acordes dos partidos dele de tensão, ia ficar uma bela bosta).

Até aqui, talvez nada de muito novo tenha sido dito. Ainda assim, toda essa discursão foi necessária para o questionamento com o qual gostaria de finalizar, revelando aonde de fato quero chegar com tudo isso: se a rima surgiu como recurso sonoro, será que, nos primórdios, havia preocupação a "riqueza" desta?

Pensemos e pesquisemos.
Abraços

Achas que a citação de Djavan como "brega" em Divisão de Bens deve permanecer?